O documentário turco 'Gatos' traz uma reflexão curiosa. Um dos entrevistados diz que, enquanto os cães acham que os seres humanos são deuses; os gatos sabem que isso não é verdade. Para os felinos, as pessoas seriam meros intermediários entre o profano e o sagrado. Por isso, eles são mais independentes, prezando a liberdade de não ter um dono.
A rica observação é apenas um dos motivos para assistir à obra de Ceyda Torun. A diretora elege sete gatos, entre as centenas de milhares de Istambul que, sem proprietários, circulam e se relacionam com o seu entorno, constituindo autênticos personagens de uma metrópole pulsante, em que o porto, a especulação imobiliária e certo ar provinciano convivem.
O encanto do filme está na maneira como são articuladas as imagens dos gatos; se espreguiçando, caçando alimento, disputando espaço, ganhando carinhos; e os habitantes da cidade. Há depoimentos tocantes, como os que atribuem aos felinos a capacidade de indicar a presença de dinheiro ou ainda de curar tormentos da alma.
Os entrevistados são diversos origens: de um pragmático dono de restaurante a uma reflexiva artista plástica. Eles lançam sobre os gatos, cada um dentro de suas referências, distintos olhares. Falando em olhos, essa parte do corpo dos felinos é ressaltada no filme. Afinal, são eles que, sem adoração, nos lembram que não somos deuses, não é mesmo?
(*)Oscar D'Ambrosio é Doutor em Educação, Arte e História da Cultura e Mestre em Artes Visuais, atua na Assessoria de Comunicação e Imprensa da Unesp.
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